Diadorim Prelúdio
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O feminino que se lança nas veredas do amor é a tônica da escrita de Sandra Amora. Nesse livro, a autora investe na superposição das cartografias afetivas de dois personagens clássicos da literatura brasileira: Diadorim e Tieta.
Ao promover uma desterritorialização de tamanha ousadia, tecendo o encontro deles e a partir daí outra rede de acasos, percursos e desafios, o que prevalece na escrita da autora é o exercício da intertextualidade.
Nos deparamos com um mapa improvável capaz de juntar o herói roseano com uma das mais famosas protagonistas criadas por Jorge Amado. Um encontro sob o sol da paixão e da descoberta de si no mundo, impregnado da resiliência marcante da vida severina no sertão nordestino.
O que podemos observar é que o pastiche, como recurso literário que prima pela manutenção máxima do estilo de uma obra, permite a Sandra promover o entrecruzamento da criação de diálogos com trechos que apelam para citações de Grande Sertão Veredas. Uma reverência à obra de origem capaz de produzir uma leveza brincante e que soa como uma contação de história.
Nesse ambiente criado por Sandra, podemos partilhar um relicário brasileiro que expressa seu amor pela terra natal. A fauna e a flora do país se revelam como outros protagonistas do nascimento e vida do herói do sertão.
Antes de tudo, o que se percebe é justamente a alegria da escritora-leitora ao convidar seus personagens prediletos, no caso de Diadorim já um par constante, à reinvenção de situações que desenham a beleza de cada um deles, também, ajustados aos códigos que se apoiam nas pautas contemporâneas.
Sandra traz à tona questões relacionadas à gênero, transição de gênero, homoafetividade, com a leveza das primeiras aventuras juvenis, com a tensão que expõe a moldura homofóbica e machista brasileira. Situações essas que revelam a violência, mas também a beleza de um mundo extravagante que une o sertão ao agreste, no interior do interior.
Narrativa quase saudosa, que se faz compreensível para uma escritora que é estrangeira residente, em Paris, legítima companheira dos jovens Dodô e Tieta na reinvenção desse Brasil fictício e apaixonante, distante e invisível quando não evocado.
Entretanto, esse pacto vai além e se revela também pela escolha quase didática de enaltecer a coragem de quem opta pela legitimidade do próprio desejo, a força de quem se reinventa pela singularidade: “disse-lhe que minha valentia vinha do fato de eu bancar minha diferença” fala o Diadorim de Sandra.
O Brasil da autora é o país da diversidade e do amor.
Marcelo Carnevale