Ignóbil
12,00€
1 en stock
«Não era a primeira vez que Lucas sumia. Das outras vezes, porém, nunca tinha sido muito difícil encontrá-lo. Bastava alguns telefonemas e uma olhada na luneta para topar com ele lá, reinando entre os mendigos do centro da cidade, causando alvoroço em algum hospital psiquiátrico, fazendo amigos, inimigos, arrebentando estruturas, dissolvendo parâmetros, provocando dilúvios, virando a vida de toda gente do avesso.
E, depois que o funâmbulo intenso e louco passava, os que ficavam, mesmo que desorientados pela bagunça deixada, mesmo que perdidos de seus pontos de referência, ainda sim, sofriam era com a sua falta. Aquele excesso de vida desaparecera sendo substituído por um vazio que porém não era oco: havia uma sombra lá, no vazio que um dia esteve cheio. Após retumbar com tamanha intensidade sobre outras vidas, Lucas deixava uma ausência surda e devastadora, como o silêncio carregado de gravidade que as cidades destruídas por furacões, os bulevares ensurdecedores em dias de feriado ou as vilas fantasmas provocam no viajante solitário que observa tudo da janela do trem ».
Ignóbil é desses romances de formação de fluxo de consciência e prosa refinada, uma novela de interrogação e busca que é uma aventura pessoal da personagem Catu e mais um grupo de amigos esotéricos, viajando metafisicamente pelas drogas e desapego dos bens materiais (em tempos tão materialistas) reeditando um existencialismo presente nos romances de Cortázar de 1960 e seu Clube da Serpente, um microcosmo que reproduz o macrocosmo que não se domina. (Marcia Denser)