Geografia dos mitos brasileiros
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Lobisomem, Saci-Pererê, Mula sem Cabeça e muitos outros seres fantásticos, que povoam a imaginação do brasileiro, são os grandes personagens da Geografia dos Mitos Brasileiros, de Luís da Câmara Cascudo. Para muita gente, perdida pelos grotões e roças do país, eles são criaturas tão vivas quanto o vizinho ou o leitor. Não é para menos. Alguns costumam se intrometer na vida humana, como perturbadores ou entidades benéficas, exigindo doações (o fumo de rolo que o caboclo deixa na encruzilhada para o Saci) ou atendendo pedidos, como o Negrinho do Pastoreio. Ou até engravidando moças, função exercida com muita competência pelo boto. Esses mitos, ainda palpitantes de vida entre a sociedade rural, estão presentes em todas as regiões do país, como assinala o levantamento de Mestre Cascudo, estado a estado, mas cada vez mais ameaçados pela penetração do rádio e da televisão. Como em todo fato social, há os mais populares (que Cascudo classifica como mitos primitivos e gerais), nos quais se incluem ainda as entidades que formam os ciclos da angústia infantil e dos monstros. No primeiro, figuras aterradoras para as crianças, como a coca, as bruxas e o Mão de Cabelo, de Minas Gerais, que corta a minhoquinha dos meninos que não querem dormir. Entre os mitos de menor abrangência geográfica, que Cascudo classifica como secundários e locais, há alguns que ultrapassaram a sua região e hoje são conhecidos em todo o país, graças à literatura (a Cobra Norato, motivo do poema de Raul Bopp) e o Matita Pereira, da música de Antonio Carlos Jobim. Com a sua erudição sem pedantismo, sempre com o dom de interessar o leitor, Mestre Cascudo prova que a companhia dos monstros, muitas vezes, em vez de pesadelo, pode ser uma viagem legitimamente maravilhosa.