AI EU FIQUEI SEM ESSE FILHO
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“Um dos maiores desafios para o escritor é o de transformar assuntos mundanos em narrativa literária. Para tanto, é preciso, por meio de linguagem adequada, configurar a escrita dentro de uma nítida voz própria. Em Aí eu fiquei sem esse filho, Carla Bessa alcança esse objetivo sem tropeços, representando com amplitude e com profundidade psicológica os dramas dos que estão invisíveis ou opacos dentro da sociedade, sendo muito competente, sensível e criativa.
Ao tomar como protagonistas as vítimas da violência urbana, da doméstica e do tráfico de drogas pertencentes ao extrato social mais baixo e ignoradas ou banalizadas, em grande parte, pela imprensa, a autora corria o risco de apresentá-las de forma caricata ou panfletária. No entanto, para o bem de literatura, essas personagens construíram-se complexas e humanizadas dentro de situações verossímeis ainda que derradeiras.
Destacam-se, também, a boa organização interna, não havendo incongruências entre os contos; o bom ritmo imposto às histórias; e a atmosfera oscilante, limtrofe, entre a lucidez e o adoecimento mental dos que estão imersos em alguma forma de desamparo.
A morte, tema universal, provavelmente, o maior de todos, percorre o livro de maneira delicadíssima. Sendo concreta, via o suicídio – tema pouco e mal-abordado na literatura – ou por meio de assassinatos, e sendo moral e psíquica, ela personifica-se, de certa forma, como uma personagem maior, quase como uma narradora além dos narradores, ampliando o seu significado e potência. Aqui, cabe ressaltar também, a feliz alternância desenvolvida pela autora entre narradores de primeira pessoa, de terceira pessoa e os recortes jornalísticos, os quais contribuem para a estranheza necessária a esse gênero literário.
Os contos apresentam elaboradas histórias ocultas, todas abertas a diferentes apropriações por parte do leitor, com doses de estranhamento instigantes, provocando e sensibilizando o leitor.
Por fim, o livro coloca a autora em um patamar avançado no que concerne ao labor literário. Há, sem dúvida, mérito e originalidade indiscutíveis em seus quinze textos.”
Luiz Ruffato e Helena Terra