Os ovos misteriosos
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« Os Ovos Misteriosos, de Luísa Ducla Soares, com ilustrações de Manuela Bacelar, tem somado sucessivas edições, desde que foi editado pela primeira vez em 1994. Agora, com o selo do Plano Nacional de Leitura, conta com a sua 14ª edição.
É muito fácil de compreender a aceitação que a obra tem colhido junto dos leitores mais novos e, evidentemente, junto dos adultos que a disponibilizam às suas crianças, sejam pais, professores ou educadores. A impressão digital de Luísa Ducla Soares, um dos nomes cimeiros da nossa literatura para a infância encontra-se bem visível no livro: marca de folgada brincadeira, sempre capaz de revirar o mundo do avesso, olhando-o sempre pelo prisma menos óbvio, menos convencional, que é, afinal de contas o mais natural do universo infantil, alia-se à toada rítmica, cada vez mais rápida e cadenciada, e que nos momentos chave acaba por fazer confluir o texto narrativo, em texto poético, rimado e compassado, e ao inevitável humor que joga com o inesperado para naturalmente despertar o riso. Por fim, de uma forma habilmente subtil, sem exibir um carácter didáctico que, muitas vezes, de tão evidente, acaba por ter o defeito exactamente oposto, traduz uma forte mensagem em defesa da igualdade na diferença e dos laços de fraternidade.
A história é muito simples: uma galinha poedeira, farta de ser explorada em prol de gula da gente humana decide fugir: «Já pus 1000 ovos. Podia ser mãe de mil filhos. Mas não tenho nenhum por causa da gente gulosa - cacarejou certa manhã a galinha. - Vou fugir.» Fugida da capoeira para a mata, fez o seu ninho e pôs o seu ovo, «muito branquinho», tal como é descrito na história. Ao ausentar-se para se alimentar, o mundo virado à cambalhota faz sentir o seu efeito: « Cocorocó…Que vem a ser isto - disse ela. - Na minha capoeira tiravam-me os ovos, aqui oferecem-mos, Mas que sorte.». Com cada ovo do seu feitio, cor e tamanho, os filhos da Galinha saíram diferentes e sui generis, mas bem ao inverso da história tradicional do Patinho Feio, a galinha, após o seu espanto, a todos adoptou com o mesmo esmero e carinho. Além do pinto, nasceram um papagaio (Ai, mas que filho/eu até desmaio! Em vez de ser pinto/ é um papagaio!», uma serpente, uma avestruz e um crocodilo (Ai, mas que filho!/Deve vir do Nilo/ Em vez de ser pinto/é um crocodilo.». Sempre com a nota de humor que a caracteriza e que a faz olhar o mundo pelo lado reverso da ironia, vemos nas páginas seguintes uma Galinha atarefada a cuidar destes filhos todos tão diferentes, por exemplo, a «lavar as dentuças ao crocodilo» ou a coçar «a serpente quando ela tinha cócegas, porque à pobrezinha faltavam as patas». O resultado final só poderia ser feliz: toda esta bicharada se uniu com garras e dentes (literalmente), quando o pinto se viu em apuros roubado por um menino sem coração, com vontade de fazer dele um belo assado «para o jantar».
E a conclusão deste divertido livro, belissimamente ilustrado pelo traçado de Manuela Bacelar, nasce em forma de poema, com um ensinamento coeso e profundo, e com uma sábia combinação entre o literal e o alegórico: « Somos todos irmãos / somos todos diferentes / há uns que têm bico / outros que têm dentes / há uns que têm escamas / outros que têm asas, / na terra e na água / fazemos nossas casa (…) / Somos todos diferentes / mas todos queremos bem / à boa da galinha / que é a nossa mãe.».
Rita Taborda Duarte (leitur@gulbenkian)